Muitas pessoas buscam relativizar as coisas, especialmente quando algo vai contra sua maneira de pensar, acreditando ingenuamente que isso faz a verdade ir para o lado deles. Um ponto sobre o qual não devemos abrir mão é a questão da lógica, pois, sem ela, os fatos mais absurdos tornam-se realidade.
Vamos relatar uma situação hipotética antes de falarmos do fato a que nos propomos abordar, visando estabelecer a base lógica com a qual devemos encará-lo.
Numa cadeia pública, de uma certa cidade, havia um preso que tinha sido condenado há pouco tempo, pelo crime de homicídio, a que era vigiado por dois guardas. Determinado dia, esse preso foi visto andando pelas ruas da cidade rumo à estrada que dava acesso a uma rodovia principal, que levava à capital do Estado. Entretanto, não conseguiu ir muito longe, pela pronta ação do delegado local, que conseguiu capturá-lo antes que sumisse completamente do mapa.
Interrogado, afirmou que um dos guardas o havia expulsado da cadeia. Querendo saber o que realmente havia ocorrido, o delegado convocou os dois guardas para interrogatório, o que fez em separado. Um deles disse-lhe que o preso estava mentindo que, na verdade, ele havia fugido, enquanto o outro guarda vem com a versão de que, por ser parente próximo do preso, ele simplesmente o deixara sair.
Assim, o delegado se viu diante de três versões para um mesmo fato; e o pior, sem ter como definir o real motivo pelo qual o preso saiu da cadeia: se fugiu, foi expulso ou o deixaram sair.
Lembramo-nos de São Jerônimo que disse que “A verdade não pode existir em coisas que divergem”. Se esse pensamento estiver certo (e acreditamos que está), então não há como fugir do fato de que dois personagens dessa história estão faltando com a verdade. E para nós, essa é a lógica que se deve aplicar ao caso, bem como aos que se lhe assemelham.
E por mais estranho que pareça, essa é uma história que se assemelha a que se conta sobre a saída dos hebreus do Egito. São três versões que a Bíblia nos traz: 1ª – foram expulsos (Ex 12,39); 2ª – o Faraó os deixou sair (Ex 13,17); e 3ª – fugiram (Ex 14,5). Há, ainda, a afirmativa de que foi o próprio Deus quem os tirou da servidão (Ex 20,2), será que poderíamos considerá-la uma outra versão?
Levando-se em conta a frase citada, podemos, então, dizer que, em boa lógica, somente uma das versões é verdadeira; com isso, a tese dogmática da inerrância bíblica cai por terra, para desgosto dos que se deixaram fanatizar pelos argumentos dos teólogos, que nunca se basearam na verdade; mas em se manterem, se não no poder, pelo menos em evidência.
Embora saibamos que poderão nos contestar, afirmando que o fato é um só, e que a eventual divergência de narração decorre da visão dos narradores bíblicos, porque Deus é infalível, afirmamos que, ainda que se atribua tais erros a Seus enviados, eles são considerados como sendo inspirados por Ele; tal fato, seguindo-se a lógica, impede que se admita a existência, de um único erro sequer, da parte de Deus, sob pena da infalibilidade divina ser maculada.
Paulo da Silva Neto Sobrinho
dez/2010.